terça-feira, 24 de abril de 2012

Domingo, família e uma vida infeliz

Domingo, 13 horas, prova para concurso público, para a Caixa Econômica Federal. Foda-se essa porra. Sonho dos pais vê-lo trabalhando num banco, na prefeitura ou em qualquer outro local público. Sonho de qualquer um. Menos o dele. Ele quer que tudo se foda.
Português, matemática, ética, jurisprudência bancária. Pergunta 1, 2, 15, vai respondendo, uma a uma. Ela aparece em seus raciocínios lógicos. "Sai daí caralho!" - ele pensa. Ela sai, e o leva consigo. Ela, eu, uma imensidão azul escuro, a lua iluminando-os, as estrelas irradiando amores, e os corpos interligados pelas mãos dadas. Ela conta estrelas enquanto ele conta que a ama.
Pergunta 41, selic, cetip, Banco do Brasil, a galega aparece novamente, dançando, cantando e recitando os poemas que ele gosta. A cena mais linda. E nunca vai acontecer.
"Ele vai passar, tenho certeza" - diz o pai. O orgulho da família, o sonho da família, passar no concurso público. Emprego estável, salário bom, convênio médio que todos desejam. Fica 5 anos e pede demissão.
- Como foi o trabalho hoje?
- Foi ótimo!
- Foi promovido filho? Conseguiu aquele curso que tanto queria? O que aconteceu?
- Melhor que tudo isso. Pedi demissão!
- Você o que?
- Pedi demissão.
- Você é imbecil? É retardado? Nunca mais terá uma chance como essa! Vai trabalhar com o que agora? Imbecil!
- Vou fazer o que sempre quis. Não gosto de trabalhar de terno, cabelo curto e barba aparada. Essa coisa certinha não combina comigo. Eu gosto é do estrago, da incerteza. Eu vou viver meu sonho, não o seu.
Saiu, se fodeu e viveu a vida que sempre quis. Sem ela, que ainda corria por seus pensamentos.